13 Sentimentos não é necessariamente uma "história de gay sofrendo". Tampouco é uma história de "gay trambiqueira, gay empinando moto ou gay dando tiro". Aliás, me contradigo: talvez sim, o filme ainda se aproxime da caixinha de gay sofrendo, mas dessa vez por amor, cercado de amigos que lhe dão apoio e mãe compreensiva.
“Baseado em sentimentos reais”, como diz a cartela inicial, o longa de Daniel Ribeiro (Hoje Eu Quero Voltar Sozinho) acompanha João (Artur Volpi. Sósia de Daniel Brühl?), que acaba de terminar um relacionamento de dez anos de duração e agora parte para o mundo dos aplicativos virtuais de encontro e de flertes em festinhas almejando encontrar uma pessoa com a qual se identifique e possa viver algo mais intenso (seja sexo ou amor). Jovem cineasta em busca de fazer seu primeiro longa-metragem, ele ainda segue próximo do ex, com o qual troca mensagens e compartilha momentos da vida, enquanto tenta se equilibrar para pagar o aluguel do pequeno apartamento onde mora em São Paulo e encontra os amigos 39 vezes por mês em cafés.
A fotografia de Pablo Escajedo e a direção de arte do estreante João Vitor Laje compõem logo de cara o apartamento do protagonista com uma sala/cozinha assépticas. Tudo é branco ou cinza, nos objetos e iluminação. Pontos vermelhos são a camiseta de João, a mala e filtro de barro. E a bandeira do Brasil na cor rosa que abre a projeção. No entanto, quando um determinado personagem entra no cômodo no meio do filme, as luzes âmbar quentes dominam o ambiente antes acinzentado, na tentativa de transparecer a mudança afetuosa que aquela pessoa representa.
Possibilidades, aliás, com as quais João gosta de brincar. Tentando escrever um roteiro para seu longa (metalinguístico para o filme), ele imagina hipóteses dos seus pretendentes, como seria se compartilhasse o apartamento com um, o que aconteceria caso não tivesse terminado um relacionamento anterior. A meiguice inicial do projeto vem com boas ideias de discussões contemporâneas urbanas relacionadas à união de duas pessoas, como o conceito de “entidade” que um casal se torna ao unir gostos e desejos, individualidade de cada integrante, ou conversas sobre sexo e relacionamentos abertos.
No entanto, essa doçura é exagerada a partir do momento que Daniel Ribeiro nos apresenta um microcosmo paulista cool quase perfeito, onde os problemas não parecem existir e muitos personagens são iluminados com pensamentos inteligentes, vindos de pessoas transparentes e com conselhos sábios, por vezes eivados de frases de efeito. Aos poucos, o que poderia ser uma trama simpática e de momentos mais pungentes, vira o apartamento asséptico de João na abertura do filme.
É um trabalho hercúleo para qualquer filme alcançar a naturalidade dos seus personagens e ações. Exemplos nacionais recentes, como A Felicidade das Coisas ou Estranho Caminho, podem ser um bom parâmetro sobre como fazer um personagem fechar um portão ou atender uma ligação sem parecer que foi ensaiado. Em 13 Sentimentos isso não ocorre, seja por conta de chamadas de vídeo nas quais a posição da câmera ou atenção daquelas pessoas na ligação são totalmente fora da realidade de um cidadão comum, seja por momentos nos quais duas pessoas riem ao mesmo tempo e parecem engessadas na ação.
Além disso, impressiona como os dois amigos de João parecem estar sempre disponíveis pra um café (eles se encontram 39 vezes no espaço de tempo no qual um filme está em cartaz no cinema da trama, então eu chutaria um período de dois meses). Aliás, todas as pessoas no filme são publicitariamente bonitas, a ponto de, quando João aparece com um suéter laranja, eu jurava que ia começar uma propaganda do Itaú oferecendo a laranjinha.
Até existem acertos no humor leve: vemos João com bloqueio criativo no roteiro que quer escrever, em pé na cozinha, e do nada partindo para “escrever” no computador é uma cena que gera uma boa risada, assim como outra na qual o protagonista ganha um prêmio por um trabalho involuntário, demonstrando que havia potencial para quebras de expectativas bem trabalhadas. Mas as derrapadas nas tentativas de dar profundidade aos sentimentos são muitas.
Há muitos filmes que conseguem transpor para a tela o efeito devastador da solidão na contemporaneidade, mas aqui os esforços são quase todos falhos. Em uma conversa com a mãe na qual João está muito triste, por exemplo, o volume da música dramática aumenta quando o rapaz está prestes a chorar, num momento de pura sacarina que tenta envolver o espectador quase que por meio de fraude mal feita.
O protagonista João oscila entre o adorável e o insosso. Compara vida com séries e filmes, é adepto e aberto a decisões não convencionais (terminar o namoro e continuar amigo, filmar casais fazendo sexo), mas também tachado pelos amigos como alguém cheio de regras que nunca ficam necessariamente claras ao espectador. Tímido e observador, o personagem esquece as experiências ruins pregressas e tende a idealizar o passado, o que talvez gere identificação com muitas pessoas que assistem ao filme, visto que remoer o passado é mais comum do que se imagina.
As frases e conselhos clichês são, em sua maioria, grandes verdades, como o próprio filme diz. O problema é, e sempre será, a maneira como a obra repassa esse clichê. Não é martelando muitas vezes um cubo mágico como representação da complicação da vida que essa verdade vai impactar ou emocionar quem a assiste.
Mas pelo menos o filme sabe que o cubo mágico é uma metáfora barata.
Nota: 2/5

Muito massa! O filme não parece ser lá essas coisas, mas a crítica ficou excelente