top of page

Maníaco do Parque | Crítica

Foto do escritor: Messias AdrianoMessias Adriano

Atualizado: 15 de jan.


Maníaco do Parque Silvero pereira

Antes de falar sobre um serial killer em um meio de comunicação ou em forma de arte, é de bom grado analisar: o que traça a linha imaginária entre contar uma história real respeitosamente de um lado, e transformar tragédias violentas em puro entretenimento de outro? Que abordagem poderia apenas dar palco para maluco dançar e o que poderia evitar tal resultado? Com uma filmografia que envolve a trilogia A Menina Que Matou os Pais, Carrossel: O Filme e o clipe musical Sou A Barbie Girl, da artista Kelly Key, o diretor Maurício Eça foi o escolhido para fazer essa reflexão e trazer às telas um filme sobre o Maníaco do Parque, um dos mais famosos assassinos em série do Brasil.


Na trama, após a descoberta de várias mulheres mortas e violentadas em um parque de São Paulo, o praticante das atrocidades Francisco (Silvero Pereira) parece gostar de toda a atenção que a mídia dá aos seus atos enquanto passa despercebido em sua rotina de motoboy profissional e patinador amador. Enquanto isso, uma jovem jornalista chamada Elena (Giovanna Grigio) torna-se obcecada pela história e busca ser a principal responsável pelas matérias sobre o caso no jornal em que trabalha.


Assim como fez no filme sobre Suzane von Richthofen, o diretor Maurício Eça aposta muitas fichas na ambientação temporal. Vemos veículos da época, bandeiras do Brasil espalhadas pela cidade (em virtude da Copa do Mundo de 1998), ouvimos músicas que fizeram sucesso na época (Charlie Brown, Racionais MCs, Radiohead) e 2 a cada 3 pessoas na redação do jornal fumam cigarros como se bebessem um copo de água.


Nesse sentido, para além da recriação da época, existe uma boa execução da figurinista Tica Bertani em destacar a protagonista Elena com roupas quase sempre vermelhas no meio daquele ambiente cinza onde ela trabalha. O idealismo e determinação da jovem jornalista são o que movem a personagem e o que a diferenciam naquele ambiente masculino, empoeirado e agressivo.

Maníaco do Parque Giovanna Grigio

E obviamente machista. “Mas o que a mulher fez?”, pergunta o chefe da redação quando lê o rascunho de uma matéria sobre um marido que atropelou a esposa. “Você pode ser a minha assistente”, responde um jornalista mais velho enquanto massageia o ombro de Elena, em uma demonstração do assédio escancarado do ambiente.


Mas escancarada é também a intenção do filme em dar protagonismo feminino de forma pouco inspirada. Repetem-se cacoetes e clichês de filmes de gênero investigativo. Os diálogos pobres, parecendo que foram escritos com o objetivo de serem ruins de propósito, ou então tirados de uma esquete de humor que parodia outras obras.

Como filme sobre jornalismo, é claro que uma personagem irá esperar as primeiras prensagens do jornal o qual havia escrito a matéria da capa, pegar um exemplar na rua, antes do objeto entrar no caminhão, e sorrir envaidecida. “Cadê você, filho da puta?”, pergunta Elena enquanto cerra os dentes e olha para uma parede na qual estão pregadas diversas fotos, mapas e notícias relacionadas ao assassino (como thriller investigativo que tenta ser, essa não poderia faltar).


Ou a protagonista sair orgulhosa e sorridente de um prédio após esbravejar com um vilão e dar uma bela lição no indivíduo com frases do tipo “Lixo é você” ou “Injustiça é o que você fez”, que poderiam muito bem serem ouvidas em uma discussão entre alunos do quinto ano do ensino fundamental.


Estruturalmente bagunçado, o roteiro tenta se sustentar entre temáticas como as dificuldades da mulher em uma sociedade machista, a ética jornalística e crítica ao sensacionalismo midiático e, por que não, o perdão a um pai ausente. Eu me pergunto se algum produtor jogou alguns papéis com diversos assuntos pro alto, selecionou três deles e deu pro roteirista dizendo: “Desafio do mês! Faz um filme disso aí e me manda até 15h.”.


Insere-se na trama uma irmã da protagonista que convenientemente é psicóloga, interpretada por Mel Lisboa. A mulher profere não um, mas dois discursos sobre características de psicopatas quando a irmã jornalista está em crise e buscando ajuda para lidar com o assassino (ou achar o assassino).


Um psicopata assim, ninguém vê, ninguém desconfia”, diz a irmã psicóloga, mas sem perceber que qualquer pessoa que olhasse para Francisco e visse um rapaz olhando pra frente enquanto encosta o queixo no peito e olha para as nádegas de uma mulher em uma igreja poderia pensar: “hummmm... Talvez esse carinha aqui seja um pouco estranho”.

Maníaco do Parque Silvero PEREIRA

O modus operandi de Francisco não deixa de ser curioso: o assassino procura mulheres fragilizadas, justamente a fim de utilizar seu próprio talento e persuasão para convencê-las a acompanhá-lo dentro da mata mais fechada no parque. No entanto, o filme simplifica as abordagens com a sutileza de um touro em uma loja de cristais (em determinado momento, o psicopata simplesmente decide falar com uma mulher que está chorando, por exemplo), a ponto de jamais acreditarmos que aquele homem teria o real poder de fazer com que aquelas mulheres caíssem nas mentiras dele.


A trilha sonora é onipresente, permeando o filme em todos os momentos e o tempo todo comentando o que vemos em tela: dos momentos de tensão, aos momentos mais calmos, dificilmente escutamos algum tipo de silêncio nesta produção nacional.


Em uma passagem que poderia constituir um bom momento do filme e que talvez funcionasse bastante no papel, as mulheres de fato começam a ter voz, em depoimentos de vítimas sobreviventes do assassino que chegam a ensaiar algum tipo de sobriedade e emoção, um pouco mais distante dos exageros iniciais. Fala-se, inclusive, sobre a vergonha de ter acreditado naquele homem.


Mas é claro que isso talvez dure dez segundos, quando a cena é interrompida bruscamente por reconstituições dessas mesmas mulheres tendo as roupas rasgadas, sendo estupradas e fisicamente machucadas, o que por si só já demonstra completa falta de respeito ou tato, contradizendo o que o próprio filme parece defender na pior hora possível. O peso do que o psicopata fez (condenado pela morte de 7 mulheres e estupro de 9, mas acusado de atacar 21) parece querer ser transmitido muito mais pelo choque forçado e gráfico do que pela tentativa de entender ou se compadecer com as vítimas.


Com boas intenções de mostrar e dar importância a outro ponto de vista que não fosse o do assassino, Maníaco do Parque na verdade contém uma pobreza artística e a profundidade de uma redação do ENEM escrita pelo aluno menos criativo da turma, uma obra cujo verniz evoluído se revela armadilha, uma narrativa de empoderamento construída de forma torta, vazia e, em muitas vezes, risível.


 

Nota: 1/5

nota 1 estrelinha de 5

186 visualizações0 comentário

Posts Relacionados

Ver tudo

Barbie

Komentar


bottom of page