
Se existe uma franquia atual de ação hollywoodiana que tem uma confiança de qualidade sempre boa, essa franquia é Missão: Impossível. Só o fato de ter o seu mais fraco título vinculado ao nome de um dos grandes diretores de ação (John Woo, que foi responsável pelo ruim Missão: Impossível 2) já poderia dizer muito sobre o alto padrão dos filmes estrelados por Tom Cruise.
Em “Acerto de Contas Parte 1”, Ethan Hunt (Cruise) e seus colegas se juntam mais uma vez para partir em busca de uma chave misteriosa cuja posse em mãos erradas poderia encaminhar o mundo para destinos fatais, o que inclui fáceis derrubadas de nações com alto poder militar, como Estados Unidos, Rússia ou China. Não à toa, os representantes desses próprios países também se interessam em pôr as mãos no objeto, todos considerando que ele estaria seguro apenas sob seus domínios, mas o mundo inteiro estaria sob ameaça se a posse for de outra pessoa.
A série que já explorava o deepfake muito antes de ser modinha, com máscaras e dispositivos físicos de alteração de voz que permitem a transformação dos agentes em qualquer outra pessoa. É curioso, portanto, vermos que tanto a equipe de Hunt, quanto o “vilão” deste novo filme, agora conseguem alterar a identidade das pessoas em tempo real pelos sistemas virtuais, dificultando e confundindo a vigilância das câmeras de segurança, o que gera uma boa cena situada no aeroporto de Abu Dhabi. Se hoje em dia um app de celular consegue um resultado parecido, porque eles não conseguiriam um resultado melhor, certo?

O fato de o filme ser a primeira parte de uma história que continuará posteriormente não o faz inacabado. Aqui há um arco completo, onde, apesar da longa duração, nenhuma passagem soa gratuita ou desnecessária, com personagens perseguindo, alterando os planos e conquistando objetivos a cada passo.
Vale ressaltar que os objetivos a serem alcançados jamais são postos na esteira de um patriotismo cego ou de uma xenofobia problemática: o “vilão” é uma inteligência artificial sem rosto ou bandeira, uma espécie de Chat GPT com esteroides, cujo funcionamento é quase que totalmente desconhecido por todos. O que o grupo de heróis liderado por Ethan quer, na verdade, é destruir a chave para que ninguém a tenha, e não entregar para o governo americano, diferente talvez do que James Bond faria a serviço secreto de Sua Majestade (o que não faz necessariamente de Missão: Impossível um filme melhor, visto que 007 - Operação Skyfall tinha um vilão com rosto, cujo modus operandi também era infiltração de sistemas virtuais e consegue um resultado mais, digamos, "charmoso" do que Acerto de Contas).
Mas cada um com seus estilos. James Bond tem o seu e Ethan Hunt não quer copiá-lo em charme ou elegância. No entanto, toques estéticos chamam a atenção na direção de Christopher McQuarrie e na fotografia de Fraser Taggart, que prestam homenagem ao primeiro filme da série ao trazerem de volta os planos inclinados tão presentes e marcantes no título assinado por Brian de Palma. Em se tratando de conversas que poderiam ser filmadas em planos/contraplanos comuns, essa quebra estilística é bem-vinda principalmente quando envolvem o chefe de inteligência Kittridge (Henry Czerny), assim como é bem-vinda a utilização de cores alaranjadas e quentes na sacada de Veneza com a presença de determinado personagem, e cores azuladas e frias no mesmo local, mas em outro momento, quando esse mesmo personagem morre.

E se falta impacto emocional na morte de algumas pessoas, ou se algumas passagens podem soar bregas demais (acho que já deu de pessoas desfalecendo prestes a morrer enquanto revelam um segredo pro protagonista, né?), são as sequências de ação que fazem com que você pense que sim, valeu a pena o Tom Cruise ter dado esporro em membros da equipe para que o filme fosse feito no mais alto patamar possível. Seja em uma perseguição de carro pelas ruas italianas, seja em um trem em alta velocidade, toda a geografia da cena e os riscos que aquelas pessoas estão correndo ficam muito evidentes e nunca cansativos, num ritmo feito para deixar o espectador boquiaberto e com inveja dos joelhos daquele pessoal.
Este capítulo deixa claro que ainda é um privilégio ver Tom Cruise correndo na tela grande como se toda a indústria cinematográfica dependesse daquela corrida (só não pesquisem quais são as opiniões dele sobre a psiquiatria e nem a relação dele com a cientologia). Em termos de ação, ele está certíssimo em afirmar que ele e sua equipe são o “padrão ouro” da indústria.
Nota: 4/5

Caramba, não tinha escutado esse esporro do Tom Cruise! Eu que não queria levar um carão desses