O diretor italiano Nanni Moretti segue a recente onda realizadores que apresentam obras abertamente pessoais, dentro da qual já vimos bons longas, como Os Fabelmans (de Steven Spielberg) ou Retratos Fantasmas (de Kleber Mendonça Filho), mas também nos trouxeram filmes cujo discurso e encaminhamento não passa de uma egotrip exagerada (estou olhando para vocês dois, Belfast e Bardo – Falsa Crônica de Algumas Verdades). Em O Melhor Está Por Vir, o realizador italiano examina o passado, ao mesmo tempo que reflete sobre o futuro de forma curiosa e bem humorada, mas também um pouco insossa.
A graça e a maior força do longa vêm do protagonista Giovanni (interpretado pelo próprio Moretti), que aos trancos e barrancos luta para finalizar um filme ambientado nos Anos 50, mas diversos percalços pessoais e relacionados ao trabalho surgem para o fazer duvidar se realmente “o melhor está por vir”, por mais que o homem não hesite em desafinar ao lado da esposa quando o rádio do carro toca uma música que lhe agrada. Apesar de tudo, ele continua em frente e faz o que tem que fazer, evitando dar espaço a uma reflexão paralisante, mas sim inquieta.
Profundissimamente ansioso e um tanto quanto mal-humorado, Giovanni se incomoda muito não só quando um ator muda o texto da cena que ele escreveu, mas implica também com detalhes sob os quais não necessariamente possui ingerência, como os sapatos que uma atriz usa em reuniões sobre o filme. De falar lento e comentários irônicos, não surpreende ver que nas entrevistas que concede, Moretti tem as mesmas características de entonação e sarcasmos de Giovanni, o que deixa o filme ainda mais pessoal.
Dessa forma, o diretor (tanto ficcional, quanto real), compõe um personagem que se mantém firme aos seus próprios princípios estéticos, a ponto de interromper por longas horas o set de filmagem de outro filme de outro diretor para questionar um plano e o significado daquele quadro (e essa cena me deixou na dúvida se Moretti realmente possui intimidade suficiente pra ligar para Martin Scorsese e fazer uma pergunta rápida).
O protagonista se mostra na maior parte do tempo muito confiante: por ter uma carreira artística consolidada, não abre mão dos próprios valores e se vê disposto a mudar tudo, inclusive uma cena final que agradava aos produtores que estavam salvando o filme financeiramente. Ao mesmo tempo, essas resoluções não chegam sem aviso, visto que vemos o personagem passar por certas dúvidas (talvez rápidas demais) antes de tomar determinadas decisões.
O problema aqui se encontra no fato de que, por mais espirituoso que seja, chega um momento no qual a personalidade e os questionamentos do protagonista não são suficientes para sustentar a obra por si só e o que está ao redor também não desperta tanto interesse. Nesse sentido, O Melhor Está Por Vir funciona muito mais para quem acompanha a carreira do diretor e consegue pegar as muitas referências de filmes anteriores, do que como reflexões mais profundas sobre a vida daquele(s) homem(s) (o próprio cartaz é uma releitura do filme Caro Diário, de 1993). A cena final, que provavelmente foi pensada para ser catártica, acaba soando apenas morna.
As pessoas em volta do protagonista podem até ter opinião sobre o trabalho do diretor (como na cena da mesa de jantar com os produtores coreanos), mas ele escuta e acaba fazendo o que quer. Por isso, sofre consequências na vida pessoal e artística: provavelmente seu filme não será bem visto pela Netflix e seus "cento e noventa países!"), mas ele não liga. Provavelmente o casamento irá desmoronar depois de muitos anos, o que talvez seja um problema, mas que acaba não trazendo tantas consequências assim. Sem ir para um lado ou para outro, Moretti e Giovanni seguirão fazendo o que querem.
Nota: 3/5

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