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O Soldado Que Não Existiu

Foto do escritor: Messias AdrianoMessias Adriano

Atualizado: 27 de abr. de 2023



Desde pequeno e por diversas explicações da psicanálise, o ser humano possui uma propensão a se interessar por histórias. Dentre tantos meios de consumo, como literatura ou pintura, o cinema possui um grande potencial para contá-las, tanto por ter a vantagem de colocar imagens em movimento, quanto por exercer controle sob o tempo dessas imagens na ótica do espectador.


O Soldado Que Não Existiu (um dos raros casos de adaptações de títulos na qual a tradução literal realmente não funcionaria, visto que “Operação Carne Moída” pareceria muito mais um filme de Austin Powers) inicia com o pai lendo para o filho um livro que conta uma história envolvendo espionagem.


O homem que a lê é Ewen Montagu (Colin Firth), e o que a criança não sabe é que o pai estaria envolvido em uma operação mirabolante da 2ª Guerra Mundial para enganar Hitler e fazer com que o führer acreditasse que os britânicos atacariam a Grécia, plano que envolveria o envio de um cadáver com documentos e objetos falsos. Uma grande e improvável história, mas que, de fato, ocorreu.


Há apuro estético e narrativo na composição de alguns quadros do filme que buscam traduzir bem o que é atuar na guerra de bastidores: agentes fumando cigarros dentro de salas abafadas, trabalhos burocráticos em frente a máquinas de escrever, pessoas sentadas na escada com a mão no queixo aguardando notícias do que ocorre a quilômetros de distância. Ao final das operações, é só isso o que eles podem fazer: esperar, esperar e esperar.



Um importante coadjuvante da trama é o escritor Ian Fleming, autor e idealizador do espião mais famoso do mundo (Bond, James Bond) e que de fato esteve envolvido na operação. Referências às inspirações de Fleming são bastante satisfatórias, desde “M” como apelido de um dos chefes da Inteligência, ao “Q Branch” trabalhando com a tecnologia da época. Ver o olhar do escritor brilhar ao manusear um relógio que esconde uma serra, tal qual os usados pelo 007, é uma das boas ideias do projeto , principalmente porque tais passagens não são meras referências gratuitas.


Em busca de fazer o plano dar certo, uma das farsas criadas pelo pequeno grupo de agentes envolve a elaboração de uma carta de amor para o soldado morto. Na leitura da carta, falsa, exalam sentimentos que soam puros e reais.


Autores de boas histórias sempre tentarão colocar sentimentos ou experiências verdadeiras nas obras que criam: se Fleming se inspira nas aventuras que acompanhou para escrever as próprias histórias de espionagem, nada mais natural que, para que a história do “soldado que não existiu” funcione, amores e desejos verdadeiros das pessoas que a criam sejam também colocados nos papéis que levarão a mentira para Hitler.


Entre histórias, ilusões e cinema, pouco importa tentar descobrir o que é real ou não em uma adaptação de eventos históricos. Se uma mentira engenhosa pode levar à vitória em uma grande guerra de verdade, tudo bem que uma carta falsa dentro de um filme com personagens que quem assiste nunca conheceu ou conhecerá leve esse espectador às lágrimas e sorrisos reais. Essa seria a vitória dos autores das histórias.


*Crítica publicada originalmente em maio de 2022 no site Canal Claquete.


 

Nota: 4/5


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