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Eco de Luz | Crítica

  • Foto do escritor: Messias Adriano
    Messias Adriano
  • 23 de set.
  • 3 min de leitura
Eco de Luz crítica

Se em termos artísticos “quanto mais pessoal, mais criativo”, o filme de estreia na direção do equatoriano Misha Vallejo acerta bastante ao decidir contar uma história cuja carpintaria dramática atinge níveis engenhosos de envolvimento emocional justamente por ser tão íntima. E, claro, por contar com tamanho talento daqueles responsáveis por sua gênese.


Fotógrafo por formação acadêmica e profissão, com trabalhos expostos nos mais prestigiosos museus e revistas do mundo, Misha Vallejo é ele próprio um dos personagens do documentário Eco de Luz. Após encontrar uma antiga máquina de fotografia que pertencia ao seu avô, homem que nunca conheceu, Vallejo decide documentar a própria família, grande parte deles na cidade de Riobamba, no Equador, sob o mote principal de exploração das figuras paternas.


Os depoimentos naturais e de registros intimistas são entrecortados pela suntuosa Chimborazo, montanha mais alta do Equador e vizinha à cidade onde o documentário estabelece suas bases, mas sempre mostrada com uma espessa névoa na base. Para conseguir fazer com que o pai, homem fechado, se mostre mais aberto ao diálogo à frente da câmera, Misha utiliza como uma das estratégias de aproximação construir mesa de luz, unindo os ofícios dos dois homens, fotógrafo e marceneiro. Também utiliza-se do tricô, aparente tradição de avó e pai que agora o filho, na busca pela conexão, mostra interesse.


Eco de Luz crítica

Contribuindo para o certo tom de suspense e dúvidas acerca dos caminhos que o filme percorrerá, a trilha sonora de Christian Mejia Rodriguez vai de um acordeon dramático que parece buscar algo e, ao tatear o que o próprio documentário descobre, nos conduz até notas graves que ondeiam os rumos inesperados e de mistérios desvelados pelos quais a obra passeia.


Opondo-se ao exploratório (e atingir tal resultado sabendo que terá que colocar tripés e mais tripés para capturar momentos com a família é digno de louvor), o filme trata também da importância da memória por meio da fotografia, a escrita com a luz pela qual Misha se tornou especialista. No meio de tudo, questiona-se: é justo fazer com que a família passe por isso? Não estaria o diretor almejando mero deleite egoísta e busca pessoal em cima dos traumas familiares?


Ora, mas ele também é família. Mais do que um grande filme-terapia vazio, Eco de Luz jamais ultrapassa a linha ou força a barra em termos de sugar dos personagens confissões indesejadas. Por mais que a mãe, por exemplo, verbalize desconforto com a câmera, o entrave é superado ao estilo e objetivo do filme: não há problema em deixar nas entrelinhas muito do que se discute (perpetuação de relações de abuso, por exemplo), desde que as conexões arrastadas do passado sirvam para melhor entender o presente.


Eco de Luz crítica

Fantasmas nunca antes mencionados emergem por meio de poesia com imagens: Misha projeta fotografias sobre rostos, sobrepostas na pele família quase como se aquele passado lhes fosse inerente e não permitisse fuga. Em determinado momento, transforma-se a análise dos pais ausentes e problemáticos em sensível homenagem às mães e agradecimento às figuras femininas, Mamita Luz, a avó do protagonista, especialmente.


Os pecados dos pais pesam sobre os filhos” é um conceito complexo explorado em obras que vão da Bíblia a O Mercador de Veneza. Em Eco de Luz, a frase se adequa no sentido de liberar tal necessidade aprisionada ao explorar essas heranças repassadas.


A Montanha Chimborazo é paisagem natural dos personagens que se mostra, ao mesmo tempo, perto e distante. Quanto mais próximo fisicamente se chega do monte nas viagens a partir de Quito, mais se percebe o perigo e a separação dificultada por névoas e pedras, o que também pode funcionar para a figura paterna aqui. Por um momento, no entanto, a névoa se dissipa na base da montanha.



Eco de Luz crítica

Nota: 4/5

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